Perfil: Dr. Edson Jurado da Silva

Se formar em Medicina como 1° aluno do curso é para poucos. Mas ainda ser manchete do “Diário de Noticias” como “estudante de medicina do ano de 1966” é só mesmo para o Dr. Edson Jurado da Silva, que se formou especialista em Gastroenterologia, com muitas estórias em Endoscopia Digestiva no Brasil e no exterior.

Carioca, filho de português, nascido em 1º de janeiro de 1941, Dr. Edson se graduou pela Escola de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro (UNI-RIO), atual Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro. No ano seguinte da formatura foi trabalhar na UERJ com o Professor Lafayette Pereira, onde criou em 1967, a residência médica em Gastroenterologia. Ele se recorda até hoje dos residentes que passaram por lá.

O 1° residente foi Antonio José de Araujo Lima, que havia se formado na Universidade Federal do Ceará e foi fazer internato no Hospital Universitário Pedro Ernesto:

“Ele fez residência comigo e quando eu voltei dos EUA, em julho de 1971, ele já havia se tornado médico da UERJ / UEG na época e tinha acabado de pedir demissão para voltar para sua terra natal. Para minha surpresa, anos depois o Dr. Glaciomar Machado realizou o 1° Seminário de Endoscopia Digestiva no MEC (Ministério de Educação e Cultura) no Rio de Janeiro e o Dr. Augusto foi um dos palestrantes convidados.”

Dr. Edson Jurado também se lembra de conversa com o saudoso Prof. Américo Piquet Carneiro:

“Na realidade, me disseram que ele queria falar comigo. Fui até o gabinete dele e ele me perguntou se eu teria interesse em me especializar nos Estados Unidos. Disse que sim, e ele então, condicionou a me ajudar, desde que eu revalidasse meu Diploma de Médico, o que foi feito através a prova do ECFMG (Educacional Council for Foreign Medical Graduates) – Certificate N 101-311-9, September 11, 1968. De posse deste título, ele conseguiu o “Rotating Internship” no Marion County General Hospital, na Indiana University Medical Center, Indianapolis, Indiana, onde me iniciei e posteriormente cheguei a Fellow em Gastroenterologia. Trabalhei muito (morava no hospital). Aproveitei bastante, incluindo na emergência do Hospital Geral, onde tive a oportunidade única, de como interno, fazer a autópsia dos pacientes que tinham sido atendidos por mim na madrugada. Fazia as autópsias durante o dia e a cada terceira noite, trabalhava na emergência, das 18h às 2h. Sempre tive muito apoio, não faltava nada, e em mesa próxima a minha, também fazia autopsia o chefe do serviço, e quando eu tinha alguma dúvida, bastava me virar e perguntar. Me dava a resposta e ainda dizia ao técnico que estava me ajudando para fazer a congelação. Havia um patologista sempre disponível, após o término do exame e eu via as lâminas da minha autópsia que eu havia clivado na véspera e a congelação quando necessário (inacreditável, pelo menos para mim).”

Em cada local que Dr. Edson trabalhava, sempre em tempo integral, era recomendado um livro especializado, que ele lia (ex: radiologia, anatomia patológica, etc).

“Nos serviços, como Medicina Interna, havia livros presos por correntinha nos locais onde passávamos a visita, além de pequenos laboratórios a serem usados, inclusive exigidos, pois no Estados Unidos era comum se trabalhar mais de cem horas semanais. Não faltava nada, havia tudo disponível. Gente nova interessada aprende a ler até no banheiro. Para exemplificar, certa vez, de madrugada vi um paciente internado com crise hipertensiva importante. Consegui, com apoio da enfermagem, colher a urina dele. Me deram uma garrafa escura, acido clorídrico décimo normal para dosar ácido Vanil mandélico (VMA). No dia seguinte, me chamaram, me elogiaram e me ensinaram, que se eu suspeitasse de feocromocitoma, poderia ver a glicemia de jejum se fosse normal e na hora da crise hipertensiva tendo hiperglicemia. Este é o paciente que teve descarga adrenérgica e é o típico padrão para feocromocitoma (quem colhia o sangue éramos nós ).”

Dr. Edson recorda do episódio em que se cortou durante o trabalho:

“Um belo dia, percebi que ao tirar as luvas ao término de uma autópsia havia sangue no dorso de minha mão. Olhei para o fígado do paciente que eu havia deixado ma mesa para clivagem e feitura das lâminas das peças. Fiquei muito assustado, pois o paciente ictérico apresentava fígado típico de atrofia amarela aguda, ou seja, de hepatite aguda fulminante, que eu até já sabia, mas nunca teria passado pela minha cabeça me ferir justamente com este paciente. Por acaso, justamente naquela hora se encontrava no serviço o Dr Charles Mendenhall, MD, PhD em bioquímica, especialista e pesquisador em hepatologia. Estava vendo as lâminas dos pacientes que tinha acabado de ver em consultoria. Ele soube do ocorrido e veio falar comigo. Soube que eu era brasileiro e resolveu o problema da minha possível contaminação e também me perguntou o que eu pretendia fazer no futuro. Disse-lhe que teria interesse em gastroenterologia. Se despediu dizendo, quando você concluir a parte geral do seu Fellowship em gastroenterologia venha trabalhar comigo.”

Segundo Dr. Edson, o treinamento em gastroenterologia foi excelente. Endoscopia e radiologia, teve como orientador o Dr. Roscoe Muller, tido como um dos melhores radiologistas de aparelho digestivo dos EUA (métodos básicos da época, tais como gastracidograma, biópsias de intestino delgado com cápsula hidráulica e teste de secretina pancreozimina para doenças pancreáticas):

“O serviço tinha, inclusive, sala para raio-x, usado para posicionar  cápsula de biópsia de delgado, sonda para teste de secretina, etc., que eu, como os demais Fellows manuseávamos sozinhos. Após a RS, havia discussão clínica com todo o serviço, incluindo o chefe, Dr Philip Christiansen, MD. Porém, uma vez por mês, neste mesmo horário, além de mim, os fellows,  Dr. Da Silva e Dr. Glen Lehman se revezavam discorrendo sobre temas diversos em gastroenterologia.”

Nos últimos seis meses em Indiana, trabalhou com o Dr. Charles Mendenhal eu seu laboratório de pesquisa. Ele estava começando uma pesquisa com ratos separados em dois grupos, um com alimentação comum e o outro substituindo o hidrato de carbono por etanol, com a finalidade de estudar fibrose hepática.

“A pesquisa envolvia estudo de hidrolisado protêico hepático com cromatografia em gás, basicamente, prolina, hidroxiprolina, lisina e creio, não me lembro alanina.nA pesquisa começou comigo e para iniciá-la foi necessário preparar reagente metanol clorídrico décimo normal, que eu consegui fazer aproveitando conhecimentos de físicoquímica, química inorgânica e física (eu tinha ido ao serviço de pneumologia à mando do Dr Mendenhall, para saber como eles teriam resolvido o preparo do reagente e fui então informado que haviam desistido do projeto, pois não tinham conseguido preparar o reagente e ainda me deram um tubo, bala, de gás clorídrico para o preparo ). A história é mais complexa do que aqui está relatado, mas foi esta a chance que tive para permanecer nos Estados Unidos, pois o Dr. Christiasen, me chamou e me disse assim: Dr Lawrence Lumeng retorna do Canadá em julho e nos vamos encaminhar você para o lugar donde ele está retornando. Você precisa passar 2 anos fora dos EUA para trocar seu visto para o de permanente. Ponderei que eu passaria 2 anos no Brasil, ele então me disse que no Brasil não seria possível, teria que ser no Canadá para o centro médico que nós vamos lhe encaminhar. Então, falei que eu queria voltar para o Brasil. Em tempo: o Dr. Lumeng está aposentado da Universidade e foi “Diretor de Divisão”, na Indiana University, de 1984 a 2007 se aposentou recentemente, foi diretor do Instituto de Fígado.”

Com Dr. Mendenhall, o Dr. Edson Jurado fazia consultoria de pacientes com doença hepática, peritoneoscopia, hoje laparoscopia e procedimentos como biópsia hepática, colangiografia percutânea e laparoscópica e estudos de hemodinâmica com “indocianina green”. Nesta fase participava do setor de gastroenterologia fazendo endoscopia de urgência para hemorragia digestiva nos três hospitais da Universidade, alternando com Dr. Glem Lehmam e Dr. Rusche.

“Por outro lado, enquanto Fellow em gastroenterologia, trabalhava também, com salário específico para esse fim, na Emergência do Marion County General Hospital no horário, plantão de sábado à noite de 18:00 às 2:00, que se tornou para mim uma excelente experiência, um verdadeiro hobby. Retornei ao Brasil e sempre trabalhei com residentes, como é comum nos EUA. Eles nos animam e até nos ensinam, sem dúvida em todos os níveis. Talvez pelo meu interesse em ensinar (Dr. Chritiansen comentou sobre isso no dia que me despedi dele): disse que eu tinha uma capacidade especial para ensinar e que todas as vezes que tive oportunidade, me transfigurava e o problema da língua estrangeira  desaparecia! Praticamente, só tive excelentes residentes, na UERJ, no Centro Psiquiátrico Pedro II,no serviço de Endoscopia Digestiva, MS e no Hospital Federal dos Servidores do Estados, RJ, MS, serviço de coloproctologia. Para terminar tenho a dizer que a SOBED sempre foi especial, com pessoas excelentes em todos os níveis, trabalhando sério e com muita competência. É uma grande honra pertencer a essa organização.”

Dr. Edson Jurado foi Presidente da SOBED-RJ, de 1984 a 1986. Todos os anos participa de congressos no exterior, e entre os temas recorrentes de trabalhos apresentados, ele destaca a prevenção de câncer de colorretal.

Agora, o que muitos não sabem é que além de ter sido o “estudante de medicina do ano de 1966”, Dr. Edson Jurado também conquistou o título de “Cidadão honorário da cidade de Indianapolis”, fruto de sua passagem marcante pelo Marion County General Hospital, nos Estados Unidos. Como sempre deixando a sua marca por onde passa.

“A SOBED é excepcional. Ela teve e tem gente muito boa que está trabalhando sério e está evoluindo muito, como a medicina está evoluindo muito também. Eu tenho orgulho de pertencer à SOBED. Estou com 79 anos e não sei a hora em que a gente tem que parar. Confesso que rezo para não perder o passo, para sair na época certa. Acho que ainda tenho muita coisa para fazer até porque eu sempre, todo ano, estou levando um trabalho para os EUA. Nos Congressos do Brasil estou menos, inclusive, estou super receptivo para novas oportunidades, é só me chamar”

 

RESUMO PROFISSIONAL:

Graduado pela Escola de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro, Uni-Rio

Fellowship em Gastroenterologia, Marion County General Hospital, Indiana University Medical Center, Indianapolis Indiana, USA

Titular Especialista em Gastroenterologia pela Sociedade Brasileira de Gastroenterologia

Titular Especialista e Fundador da Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva

Mestre em Medicina, Gastroenterologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro

Docente Livre em Gastroenterologia, Uni-Rio

Titular e Emérito do Colégio Brasileiro de Cirurgiões

Fellow do American College of Gastroenterology. “Governor” para o Brasil por dois turnos, com término em 2017

Cidadão Honorário da Cidade de Indianapolis Indiana USA